sábado, 11 de dezembro de 2010

UM PARALELO ENTRE A TRAJETÓRIA DE GERALDO VANDRÉ E A DA PERSONAGEM DE WINSTON SMITH, DE “1984”, LIVRO DE GEORGE ORWELL – PARTE I

"Ele foi um rei, e brincou com a sorte
Hoje ele é nada, e retrata a morte
Ele foi um rei, e brincou com a sorte
Hoje ele é nada, e retrata a morte

Ele passou por mim, mudo e entristecido
Eu quis gritar seu nome, não pude
Ele olhou pra parede, disse coisas lindas
Disse um poema pra um poste, me veio lágrimas

O que foi que fizeram com ele? Não sei
Só sei que esse trapo, esse homem foi um rei
O que foi que fizeram com ele? Não sei
Só sei que esse trapo, esse homem foi um rei"
("Tributo A Um Rei Esquecido", Benito Di Paula)  OUÇA A MÚSICA

“Duas lágrimas cheirando a gim escorreram de cada lado do nariz. Mas agora estava tudo em paz, tudo ótimo, acabada a luta. Finalmente lograra a vitória sobre si mesmo. Amava o Grande Irmão.” – “1984” – George Orwell

Geraldo Vandré e Winston Smith têm muito em comum. Ambos foram quebrados pela ditadura. Ambos acabaram tendo suas mentes transtornadas, a ponto de Winston Smith chegar a amar o Grande Irmão (símbolo do Estado totalitário de 1984) e Geraldo Vandré a adotar a FAB (símbolo do militarismo brasileiro) como sua protetora, a ponto de compor uma música chamada ”Fabiana”, em homenagem à Força Aérea Brasileira. Winston Smith foi barbaramente torturado pelo regime  de “1984”, livro de George Orwell escrito em 1948 (1948 x 1984, entenderam?) , Geraldo Vandré não admite ter sido torturado, mas suas declarações fazem supor que sim, seja ela tortura física ou psicológica. No “GLOBO NEWS DOSSIÊ” (2010) , entrevistado por Geneton Moraes Netto, Vandré deixou escapar que “guerra é guerra”, “eu não perdi! (risos) ”. Foi um riso envergonhado, sem dúvida, pois ele sabe que perdeu. Além disso, Vandré diz: “tive que passar por um processo de adaptação ao voltar”. Esse processo de “adaptação” foi, na verdade, controlado pelos militares com “tratamento” em clínicas psiquiátricas. Celso Lungaretti em seu blog “Náufrago da Utopia” sustenta a tese de lavagem cerebral. Existem depoimentos de pessoas que viram Vandré em clínicas de Botafogo, bairro do Rio de Janeiro. Geraldo diz que”chegou meio perdido e doente em seu próprio país”, quando foi “acolhido pelos militares, alojado” e que deram a ele tratamento médico. Alguns chegaram a dizer que ele teria teria sido castrado. Existem precedentes: Manoel (não citarei o sobrenome) , militante de esquerda, foi castrado, mas sobreviveu e nem por isso passou para o outro lado, como parece ter sido o caso de Vandré. Digo parece, porque a hipótese de lavagem cerebral é crível, mas minha opinião pessoal é de que ele foi tão maltratado, enlouquecido, pagando por seus “pecados” por ter composto “Caminhando”, a marselhesa brasileira, que ele não teve condições psicológicas de voltar com suas atividades musicais coerentemente, pois não dá para dizer, de forma alguma,  que “Fabiana” é coerente com seu passado, por outro lado, ele se mostra aparentemente lúcido na entrevista e mede nitidamente as palavras. Mas por que Caetano Veloso e Gilberto Gil, que também voltaram do exílio, continuaram produzindo e fazendo sucesso e Vandré paralisou suas atividades?Vandré, em um depoimento, pouco depois de ter chegado ao Brasil, declarou que “a partir de agora, só faria canções de amor e de paz”, Gil declarou: “não tenho mais compromissos com a história”. A minha opinião é de que a ditadura brasileira considerava Vandré mais perigoso que Caetano e Gil. Geraldo admite que sua chegada ao Brasil se deu, na verdade, 58 dias antes de sua entrevista ao “Jornal Nacional” (telejornal da Globo que, à época, apoiava a ditadura militar), em que aparecia como se estivesse acabando de chegar ao Brasil, “tudo muito manipulado”, declarou ele mesmo. Seja como for, parece que o efeito do “tratamento” se metamorfoseou num acordo em que Vandré se comprometeu a nunca dizer a verdade, pois sofreria represálias se contasse a verdade. Winston Smith também foi “acolhido” pela ditadura de “1984”. Virou um pária, assim como Vandré, envergonhado de si mesmo e impotente para lutar. O primeiro nome da personagem do livro foi uma referência à Winston Churchill, homem importantíssimo na Inglaterra. Já Smith, é o sobrenome mais popular da Inglaterra. Geraldo é um nome super comum no Brasil. Já Vandré, vem de uma abreviação do sobrenome do pai de Vandré( Vandrelísio ). Mas aí residem uma diferença e uma semelhança importantes: Vandré virou um nome mítico por causa do próprio Vandré, que compôs o hino de uma geração que lutou contra a ditadura militar, Churchill era um mito pré-existente, mas igualmente um mito. Seja fruto da cultura massificada, que Geraldo criticou na entrevista ao “Dossiê Globo News” ou não, o fato é que Vandré é, ou era, um mito.

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